Por Íris Morais Araújo
Mestre em Antropologia Social (USP)
Apreender as regras de sociabilidade que conformam as práticas sociais de jovens na Região Metropolitana de São Paulo. Este foi o convite de José Guilherme Cantor Magnani aos freqüentadores de seus cursos, graduandos em Ciências Sociais da USP dos primeiros anos do século XXI. Aqueles que aceitaram o desafio buscaram conhecer melhor alguns desses jovens, os espaços públicos que orientam suas atividades e, ainda, as regras de sociabilidade que os distinguem e que os faz relacionar, das formas mais diversas, com vários outros agentes sociais.
O NAU web sitio dá-lheos resultados das empreitadas podem ser conferidos em Jovens na metrópole: etnografias de circuitos de lazer, encontro e sociabilidade, livro organizado por José Guilherme Cantor Magnani e Bruna Mantese de Souza. Escritos com rigor e envolvimento, os capítulos de Jovens na metrópole são os primeiros trabalhos de uma nova geração de cientistas sociais que, esperamos, continue a produzir de forma obstinada e criativa. Os artigos reunidos na coletânea, relatórios de pesquisa de campo que foram sendo depurados nas discussões coletivas do NAU, jogam luz nas práticas coletivas desses jovens em momentos de lazer. Afinal, o tempo livre pode ser uma frincha da vida cotidiana em que é possível buscar realização pessoal, por meio do exercício “[d]aquelas regras de reconhecimento e lealdade que garantem a rede básica de sociabilidade” (Magnani, 1994). A perspectiva adotada ? e que vincula esta antologia a outras investigações produzidas ou orientadas por Magnani (cf. Magnani, 1984; Magnani & Torres, 1996) ? permite que o leitor conheça melhor as situações em que tais agentes possuem autonomia em relação às instituições aos quais estão inseridos, na maior parte das vezes, de forma compulsória (como, por exemplo, a escola ou o local de trabalho) e cujas atividades costumam ser vistas por eles como uma obrigação nada gratificante.
Em função desta escolha, as análises vinculam-se especialmente a um dos muitos sentidos que se atribui ao termo juventude na produção acadêmica relativa ao assunto: trata-se do momento em que os indivíduos optam por uma forma de existência, buscando realizar um vir a ser (cf. Augusto, 2005, p. 20). Desta maneira, tal termo foi, é certo, utilizado como um bom ponto de partida para que as investigações fossem iniciadas. A palavra juventude, porém, foi sendo substituída por outras: aquelas que os antropólogos descobriram em campo e que conformam identidades, circunscrevem pertencimentos, determinam diferenças e conferem sentidos ao fenômeno juvenil na concretude da existência social. Podemos depreender, portanto, que é praticamente impossível tratar do assunto no singular. Lendo os artigos, aprendemos que os jovens são jovens porque antes de tudo são góticos, forrozeiros, pixadores, straight edges, b.boys, streeteiros, ravers, instrumentistas, baladeiros, baladeiros do Senhor, baladeiros black, baladeiros de rodas de samba.
São muito ricas as análises a respeito das práticas criadas e recriadas por tais agentes na região metropolitana de São Paulo e resultado de observações acuradas. Os achados etnográficos – que privilegiaram as regularidades nos comportamentos e na apropriação dos espaços públicos – permitiram que os autores desconfiassem de certas argumentações relacionadas às formas de sociabilidade dos jovens das grandes metrópoles. Uma delas é a de Michel Maffesoli que, em O tempo das tribos, chama os agrupamentos juvenis de tribos urbanas e os qualifica como nômades, efêmeros, sem organização. Muitas críticas podem ser feitas ao uso do termo tribo para qualificar tal fenômeno (cf. Magnani, 1992) e podemos destacar sua associação feita pelos meios de comunicação de massa aos costumes exóticos e à violência que seriam inerentes à (má) conduta de muitos desses agentes.
Buscando compreender o fenômeno de maneira alternativa – e na melhor tradição antropológica, que busca afastar-se das classificações etnocêntricas apreendendo as regras que regem as ações da vida social –, os autores trabalharam em seus textos com a expressão circuitos de jovens. Segundo Magnani, este termo possibilita criar um denominador comum ante a diversidade de práticas juvenis, buscando analisá-las por meio da inserção das mesmas no espaço urbano.
Ante tal perspectiva, menos que particularismos, fragmentações ou isolamentos, as análises esquadrinham jovens de São Paulo em relação com outros jovens, parceiros com quem estabelecem relações de afinidade ou de evitação. É desta maneira – privilegiando a análise das formas de sociabilidade de alguns agentes e de seus outros –, que os autores da antologia escapam do risco de romantizar ou aviltar as práticas juvenis. Vale a pena conferir! Para mais informações, você pode sempre contatar n-a-u.org.
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